domingo, 30 de março de 2008

Eis que havia o prelúdio

Eis que havia o prelúdio.
Tudo seria bonito, belo, risonho, deve ter sonhado alguém. Eu ao menos espero que sim. Ele viria a trazer a esperança, a alegria e a consolidação daquilo que Nietzsche disse que era o fim para as mulheres.
A despeito de tudo ter começado em choro, era momento de alegria. Mas se chorei, foi porque me fizeram chorar. Explicação das mais banais. ¿Quando não mais o seria? Senão, seria algo como um ser humano assumir a própria culpa. Coisa de depressivos, obviamente. Estes são responsáveis por tudo, segundo os próprios pensamentos até mesmo pelo próprio choro (¡coisa estapafúrdia, imaginem!). Não, não escarneço deles. Meus comprimidos de Pondera que o digam. Reminiscências de outros tempos, hoje estão no fundo da gaveta. Tá bom, na época também estavam, mas por outros motivos, menos nobres.

Imagina-se que uma viagem pode ser interessante, mostrar-nos novos caminhos, novos horizontes, momentos inesquecíveis. E na mais incrível de todas... tudo obliterado, sem cicatriz, sem resquício. O nada. Muito demorou até que se retivesse alguma coisa que ficasse até hoje. ¿Por que? ¿Não seria a natureza injusta neste ponto? ¿Por que a grande mãe decidiu assim? ¿Que merda de mãe é esta? Alguém já bem disse que o amor é descendente, e não ascendente. Coisa sinistra. Não vou me perder nesta esquina. Deixa pra outro momento, hoje não quero me debater em assuntos em que sei que não terminarei bem perante mim mesmo. Único momento em que o alter ego diz que eu realmente me importo. Coitado do alter ego. Mas algum dia eu chegarei lá, é um objetivo de vida. Assim como o maior objetivo de todos: aprender a respirar.

¿Será que depois do fim teremos oportunidade de (¿re?)vermos o início? Engraçado, nunca vi ninguém comentar sobre isto. Assunto oportuno, talvez mais que inferno, dossiês e as novas putas da TV.

Já li que eu durmo em determinada posição justamente por causa desta época, saudade de tempos idos, lugares mais quentes e aconchegantes. Muito doido.

Havia muco e havia sangue, havia humores viscosos e havia pus. Coisa sinistra, reitero eu.
Não poderia de uma alquimia tão grotesca dar grande coisa.

Eis que fora o prelúdio. Eis que eu nasci. Eis que aqui estou.


P.S.: ¿Por que será?

terça-feira, 25 de março de 2008

Ensaio Sobre a Tolerância

Muitos são os nobres conceitos que permeiam eventualmente mais, eventualmente menos, a nossa sociedade. Dentre eles, podemos citar: a temperança, a sinergia, a humildade, a educação, o respeito, a pureza, a solidariedade, a compaixão, a gratidão, a amizade, a esperança e, o mais intenso de todos, o amor. Porém, hoje devo falar sobre um dos conceitos mais dispersos e esquecidos desde muito: a tolerância.


O que é a tolerância?

Segundo a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura), a tolerância é o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a abertura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz.


A tolerância não é concessão, condescendência, indulgência. A tolerância é, antes de tudo, uma atitude ativa fundada no reconhecimento dos direitos universais da pessoa humana e das liberdades fundamentais do outro. Em nenhum caso a tolerância poderia ser invocada para justificar lesões a esses valores fundamentais. A tolerância deve ser praticada pelos indivíduos, pelos grupos e pelo Estado.

A tolerância é o sustentáculo dos direitos humanos, do pluralismo (inclusive o pluralismo cultural), da democracia e do Estado de Direito. Implica a rejeição do dogmatismo e do absolutismo e fortalece as normas enunciadas nos instrumentos internacionais relativos aos direitos humanos.

Em consonância ao respeito dos direitos humanos, praticar a tolerância não significa tolerar a injustiça social, nem renunciar às próprias convicções, nem fazer concessões a respeito. A prática da tolerância significa que toda pessoa tem a livre escolha de suas convicções e aceita que o outro desfrute da mesma liberdade. Significa aceitar o fato de que os seres humanos, que se caracterizam naturalmente pela diversidade de seu aspecto físico, de sua situação, de seu modo de expressar-se, de seus comportamentos e de seus valores, têm o direito de viver em paz e de ser tais como são. Significa também que ninguém deve impor suas opiniões a outrem.


Tempos de matança

A UNESCO está alarmada pela “intensificação atual da intolerância, da violência, do terrorismo, da xenofobia, do nacionalismo agressivo, do racismo, do anti-semitismo, da exclusão, da marginalização e da discriminação contra minorias nacionais, étnicas, religiosas e lingüísticas, dos refugiados, dos trabalhadores migrantes, dos imigrantes e dos grupos vulneráveis da sociedade e também pelo aumento dos atos de violência e de intimidação cometidos contra pessoas que exercem sua liberdade de opinião e de expressão, todos comportamentos que ameaçam a consolidação da paz e da democracia no plano nacional e internacional e constituem obstáculos para o desenvolvimento”.

Parece ser evidenciada pelos fatos a intensificação da intolerância, conforme os dados do jornal estadunidense Washington Post que apresentamos a seguir:

Ø Do século I ao XV, 4 milhões de pessoas foram mortas em conflitos bélicos;

Ø No século XVI, 2 milhões;

Ø No século XVII, 6 milhões;

Ø No século XVIII, 7 milhões;

Ø No século XIX, 19 milhões;

Ø No século XX, 111 milhões (até agosto de 2000).

Poderíamos supor que a agressividade, ou mesmo a intolerância, aumentaram no período. Não coaduno com esta opinião.


Para se ter uma idéia, a população comum ia a eventos na idade média para verem animais, como ratos, serem queimados vivos, apenas por diversão.

A matança de seres humanos que nasciam deficientes foi extremamente comum em outros tempos. E é defendida até mesmo por grandes pensadores de outrora, como Platão.

Estes absurdos já não acontecem mais. Porém, hoje, ao se chegar a um dissenso, os meios que os homens encontram para resolver belicamente seus problemas potencializaram-se. Desta maneira, conflitos que antigamente terminariam com centenas, ou milhares de mortos, agora terminam com milhões. A briga que terminava em olho roxo termina num tiro e numa morte.

O Japão consolidou-se como país unificado depois da batalha de Sekigaharano, onde mais de 50 mil homens pereceram durante uma carnificina que durou seis infernais horas. Parece pouco nos dias de hoje, quando com um botão podemos exterminar os 6 bilhões de habitantes do planeta, mas considerando-se que nesta luta todos morreram pelo fio da espada, um homem matando um outro homem de cada vez, podemos imaginar a atrocidade de uma batalha como àquela e o grau de destruição que uma batalha similar, com as armas de hoje, acarretaria.

Julgo que estes sejam exemplos que a causa básica da intolerância talvez até tenha diminuído, porém, àqueles que efetivamente querem partir pro ataque, têm meios muito mais eficientes e, infelizmente, facilmente disponíveis.


As causas da agressividade humana ainda não são ao certo conhecidas. Na natureza, normalmente os animais agem agressivamente para: defender seu território, caçar e conseguir uma fêmea para copular. Afora estas três causas básicas, um líder de um grupo pode coagir violentamente seus subordinados para controlá-los e as fêmeas também agem muito agressivamente na defesa de seus filhotes. Mas, mesmo a agressividade presente em animais, em certo tempo é contida. Um lobo, ao brigar com outro e perceber que não tem chances, oferece seu pescoço. Um leopardo brinca na frente de seu similar. Estes gestos, de fraqueza e submissão, aplacam a ira do seu oponente, como acontece também com muitos outros animais na natureza. Porém, com os homens, como se sabe, a coisa não funciona a contento. Muitos são capazes de roubar, estuprar ou matar ouvindo súplicas sem se compadecerem minimamente com isto.

Provavelmente a grande causa que tenha impedido uma terceira guerra mundial, tenha sido o fato dos dois países (EUA e URSS) saberem que ambos tinham condições de destruir o mundo algumas vezes. A “Destruição Mútua Assegurada”, como era chamada a teoria que previa a aniquilação nuclear do mundo caso uma guerra entre as duas potências começassem, foi provavelmente o que impediu o começo de uma guerra. Há uma famosa frase de Einstein: “Eu não sei com que armas a Terceira Guerra Mundial acontecerá, mas a Quarta Guerra será lutada com paus e pedras.” Talvez não restem nem paus e pedras se a Rússia e os EUA entrarem em guerra.




¿Mas seria este o motivo correto para não se iniciar um conflito?

Com efeito, consideramos que a paz não é tão somente a ausência de guerra, tampouco se limita às relações internacionais guiadas pelos Estados.

A UNESCO considera que uma guerra é a ponta de um iceberg (como sabemos, um iceberg tem sua menor parte exposta, a maior parte de sua estrutura fica submersa, escondida de nossa visão).
Na verdade, a entidade considera que há toda uma cultura de violência, de respostas agressivas, de atitudes hostis, de intolerância no trato pessoal, de um cidadão comum com outro, que numa circunvolução, acaba gerando um redemoinho da discórdia, que vai subindo, permeando a atmosfera política, fazendo com que políticos que tenham uma ideologia agressiva sejam eleitos e, estes, ao chegarem ao poder, terão políticas que só conduzem à discórdia, à desagregação e à divergência. Não convém o armistício a estes, pois, eles dependem da guerra para sua sobrevivência eleitoral. Em nosso mundo atual temos peremptórios exemplos de políticos que dependem de terem inimigos para conseguirem sobreviver eleitoralmente, como George War Bush e Álvaro Uribe (presidentes dos EUA e da Colômbia). O senhor Bush já disse em entrevista “Eu sou o presidente da guerra” com um espantoso prazer em suas palavras.
É evidente que eles sempre dão a desculpa de que estão se armando apenas para apenas se defender. Porém, quem age assim, está se assemelhando ao agressor. Jean Paul Sartre (1905-1980), o famoso filósofo francês, já dizia que a violência sempre se faz passar por uma resposta à violência alheia. Ou seja, nunca somos culpados. A culpa sempre é do outro.

É muito fácil dissociarmos nossas responsabilidades deste tipo de conduta. Porém, ela começa com nós mesmos, no trato diário. ¿Quantos “George Bush” não existem no trânsito, por exemplo?

É fato que existem pessoas que, pela carga genética que receberam, acabam sendo mais agressivas que outras, mesmo tendo recebido a mesma educação e as mesmas influências culturais do ambiente em que vivem. Porém, a capacidade que possuímos de controlar nossas emoções, sejam elas boas ou más, é o que nos distingue dos animais selvagens e, permite que possamos viver em sociedade. Se não conseguimos controlar nossos impulsos, não estamos, tampouco estaremos, aptos para conviver com outros cidadãos.


A cultura da intolerância

A antropóloga estadunidense Margareth Mead (1901-1978), ao estudar três sociedades primitivas da África, verificou que em uma sociedade, ambos os sexos eram extremamente agressivos. Em outra, ambos os sexos eram extremamente dóceis. E na última, as mulheres é que extremamente agressivas. Ou seja, os padrões de agressividade são resultados de uma cultura.

Diferentes civilizações, em diferentes épocas, cultuam e/ou admitem mais ou menos a violência. Por exemplo: um certo cidadão negro, chamado Rolihlahla revoltou-se contra o racismo opressivo que imperava em seu país. Criou uma milícia para combater o governo, a despeito de vários companheiros não concordarem em reagir ao governo lutando tão agressivamente. Rolihlahla distribuiu armas e passou a combater ferozmente o status quo da época. Explodiu bombas, atirou em guardas, sabotou fábricas, incitou a violência contra a elite corrupta do seu país, espalhou o medo na população civil, enfim, agiu como muitos poderiam definir, como um terrorista. Rolihlahla acabou preso e condenado a prisão perpétua. Permaneceu encarcerado por 28 anos e, provavelmente você já ouviu falar dele, com outro nome, adotado depois de ter se batizado cristão: Nélson Mandela. Ganhador do prêmio Nobel da paz.

A violência que ele praticou, naquele contexto, não é considerada (para a opinião pública mundial) como terrorismo.

Um outro exemplo: um país que é uma ilha, declarou sua independência em 1902. Porém, em 1901, os EUA aprovaram na sua assembléia constituinte a Emenda Platt, onde se concedia o direito de intervir nos assuntos internos deste país (e também num outro, Porto Rico). Ou seja, negava à estes dois países a condição de países. Nada mais eram que protetorados dos EUA.


O protetorado era governado por um ditador extremamente corrupto, aliado da elite putrefata que esbanjava milhões enquanto a população padecia. Os já escassos recursos naturais da ilha (as lavouras mais férteis) estavam na mão de multinacionais dos EUA e estas pagavam salários de fome aos seus empregados. A maior parte da população era analfabeta, menos de 10% da população tinha leite para tomar no café da manhã.

Então, um grupo de guerrilheiros, depois de várias tentativas frustradas, desceram de Sierra Maestra, exaustos, sem alimentos suficientes, com menos homens e armas, e conseguiram derrubar o ditador fantoche dos EUA Fulgêncio Batista (1901-1973). O comandante do levante era Fidel Castro Ruz. Ato contínuo, Fidel Castro declarou a independência de Cuba dos EUA e nacionalizou as lavouras das multinacionais. Ernesto Guevara (1928-1967) cuidou de levar ao “paredón” a elite corrupta que oprimia a população carente da ilha. Cuba na verdade era um bordel dos EUA. Uma ilha de cassinos e prostituição (inclusive infantil), onde o ditador-fantoche não só permitia este descalabro, como o incentivava.

Para muitos, Fidel Castro e Nélson Mandela foram heróis e a violência utilizada por eles e por seus companheiros, estritamente necessária. Para os aliados dos EUA, para os mafiosos de Miami, para os racistas, Fidel e Mandela foram tiranos e terroristas. Cada um, na cultura em que vive, considera as atitudes dos líderes de certa maneira. “A história me absolverá”, profetizou Fidel, num famosíssimo discurso que virou até um livro. Absolverá tanto a ele como a Rolihlahla na minha modesta opinião.

Tanto Fidel, quanto Mandela, podem ter sido classificados de terroristas pelos seus inimigos. Para mim, eles eram libertadores.

Com estes dois causos, demonstramos que a cultura interfere extremamente naquilo que consideramos violência. E, por conseguinte, esta cultura, volátil através dos tempos, interfere extremamente no conceito de tolerância da sociedade.

Evidenciamos que algumas causas de batalhas podem ser consideradas justas. Porém, existem outras motivações de lutas que, apesar de também terem sido levadas a cabo por uma suposta nobre causa, demonstram-se trágicas, como veremos a seguir.


Religião X Tolerância

¿As religiões causaram mais bem ou mal a sociedade? Na verdade, basicamente todas as religiões são fundamentalistas (talvez excetuando o budismo, que mais parece um conjunto de posturas que uma religião). Por exemplo:

Ø “Ninguém vem ao pai, senão por mim”. (
Jesus Cristo)

Ø “Tu és Pedro: sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”
(Jesus Cristo)

Ø "Não julgueis que vim trazer a paz a terra.Vim trazer não a paz, mas a espada. Eu vim trazer a divisão entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra, e os inimigos do homem serão as pessoas de sua própria casa.(Mt 10,34-36)...
(Jesus Cristo)

Ø E aquele que não tiver uma espada, venda sua capa para comprar uma' (Lc 22,36). (...) Pois 'Eu vim lançar fogo a terra, e que tenho eu a desejar se ele já está aceso?' (Lc 12,49)". (
Jesus Cristo)

Ø “E eles apenas diziam, Senhor, perdoe nossos pecados e excessos, dê-nos um espírito resoluto e conceda-nos a vitória sobre os infiéis”. (
Alcorão)

Ø “Golpeie-os na cabeça, e em todas as suas extremidades”. (Alcorão)


Estas são frases fortes, que se, avaliadas fora de todo um contexto, podem levar a interpretações terríveis. Quem avalia estas frases, também não deve se esquecer de outras, pois no Alcorão não há nenhuma promessa de paraíso para aqueles que usam a violência. Ao contrário, quem mata um homem inocente age como se estivesse matando toda a humanidade. O Alcorão somente admite o uso da violência como legítima defesa, e, ainda assim, na mesma proporção do agressor, nunca provocando mais violência.

E quando Jesus foi capturado, Pedro sacou sua espada e decepou a orelha do soldado Malco. Jesus imediatamente restaurou a orelha ao soldado e ordenou a Pedro: “volte a sua espada ao seu lugar, pois aquele que vive pela espada, morrerá pela espada”.

A excessiva certeza de algo, acaba gerando, mesmo que por uma causa boa, um fanatismo. ¿Como avaliamos a “santa” inquisição, ou Osama Bin Laden? Como fanáticos, como assassinos. Porém, o que muitas vezes nos esquecemos é que, no pensamento deles, eles estavam lutando por Deus. No pensamento deles, eles lutavam pelo que há de mais nobre.
E, muitos religiosos que criticam a inquisição, são tão fanáticos e intolerantes quanto estes, só não dispõem do mesmo poder que a inquisição possuiu.














Osama Bin Laden e a “Santa” Inquisição


O poder do diálogo

Na medida em que se é tolerante, os diálogos podem ser muito mais enriquecedores e a nossa própria vida fica mais fácil. Por exemplo, quando debatemos algo com alguém, podemos nos fechar e dizer que temos a resposta correta. Porém, podemos ser tolerantes e compreendermos que, mesmo que nós sejamos ricos em experiências e conhecimentos, nós não podemos perceber e entender tudo. Nós até podemos logo pensar (e não expressar) que o outro é desinformado e ignorante. Mas também podemos conceber que o outro com quem debato também tem as suas experiências e, pode ter visto coisas que podem me auxiliar na minha compreensão. Eu posso numa discussão tentar apenas fazer com que o outro veja as coisas a minha maneira. Ou posso aproveitar para absorver novos conhecimentos que me enriquecerão em muito. As escolhas estão em nossas mãos.

Uma discussão visa fechar questões, convencer. Um diálogo visa abrir questões, visa mostrar opiniões (e não respostas). Uma discussão visa demarcar posições, defender idéias. Um diálogo visa estabelecer relações, compartilhar idéias. Uma discussão visa persuadir e ensinar. Um diálogo visa questionar e aprender.

Não é uma boa estratégia, tentarmos suprimir os dissensos, tentar evitar diálogos sobre temas espinhosos, como futebol, política e religião. Ora, sempre haverá discordância. Não adianta calá-las, elas permanecerão e, por ficarem se avolumando no seu eu interior, podem aflorar de maneira trágica. O que devemos, é termos diálogos produtivos, sem agressividade, onde possamos mostrar nossas idéias, ouvir outras, sem que para tanto nos sintamos ofendidos. Devemos respeitar as diferenças e diversidade, tentando ao máximo suspender os nossos pré-conceitos, nossas crenças, para que possamos ouvir bem. Não convém buscar “estar certo”, ou “sair vencedor” num diálogo. Se é este o objetivo, ¡um diálogo de verdade sequer ocorreu!

Mérito

Também não podemos esquecer. Tolerar um erro de uma pessoa que a gente gosta, normalmente correta e certinha, que uma vez na vida lhe tratou mal, ou que uma vez na vida lhe dirigiu uma palavra áspera, ou que uma vez na vida lhe decepcionou, é bem fácil. Não há mérito nenhum nisto. Difícil é tolerar o erro de desconhecidos ou o erro repetido. E onde há dificuldade, há mérito.


Dialética

Siga os grandes filósofos e viva a dialética: estabeleça uma idéia, tenha você mesmo o interesse de discordar desta idéia. Depois de por e contrapor, sintetize o que há de melhor em seu pensamento.














Em todas as posições que defendemos, encontraremos pontos falhos. Por exemplo: eu sou eleitor do presidente Lula e convicto de que o presidente faz um governo muito bom. Porém, é-me conveniente, até por integridade ideológica, tentar buscar os problemas do governo, as coisas que me desagradam. E, desagradam-me as taxas de juros e o câmbio sobrevalorizado. Desagrada-me a presença de alguns ministros, como Geddel Vieira Lima (¿o “Agatunado” para cuidar de uma pasta que tem tantas obras?), Edson Lobão (uma nulidade histórica de uma oligarquia histórica), Nélson Jobim (o ministro tucano), Hélio Costa (ministro da globo), etc. Eu poderia falar por horas bem do governo e do presidente, mas convém também esforçar-me por criticá-los. Ao fim das críticas, ¿ainda mantenho a minha opinião? ¿Foram argumentos fortes o suficiente para mudar minha idéia? Se não foram, de qualquer modo ajudaram-me a ver as coisas de uma maneira mais ampla e correta.

Posso também exprobrar as idéias deste próprio artigo. Por exemplo, eu julguei justas as lutas de Fidel Castro e Nélson Mandela. E injustas as lutas da inquisição e de Osama Bin Laden. Ora, ¿mas não é a cultura de tolerância que tentamos propor? ¿Como posso, ao propor a tolerância, admitir lutas que infligiram tantas mortes como justas?
¿Isto não seria uma antinomia?

Então, ¿é justa a luta de Mandela e Fidel? ¿É correto defendê-las num ensaio sobre tolerância? Ora, eu respondo que, a violência, em casos extremos, até pode ser necessária. Em situações drásticas, medidas extremas podem ser requeridas. Como já foi dito, não se salta um abismo com dois pulinhos. Porém, na minha opinião, estas atitudes extremas não devem ser utilizadas na nossa vida diária.


É o meu contra-argumento, falível, pode estar certo ou errado. Eu acredito que esteja certo, daí minha postura. Mas, eu tenho de ter na mente que sempre poderei estar errado. Sempre devo tentar buscar erros naquilo que defendo.
É o dever de um pensador.


Tolerância requer prática

Alguns psicólogos dividem em três tipos as formas como as pessoas sentem as coisas.



Onde:






O objetivo da cultura da tolerância é aumentar o quadrante amarelo, pois, dificilmente nós passaremos a gostar de uma coisa da qual já não gostamos. É evidente que se a parte verde do gráfico aumentar, quanto melhor. Aumentar nossa tolerância com àquilo que a gente odeia não é tarefa fácil, mas é muito mais fácil que passar a gostar de algo que não gostamos.


Eu, por exemplo, na minha adolescência detestava canções de axé, funk, pagode, etc. Estas músicas me incomodavam e, muitas vezes eu saí do lugar em que eu estava porque músicas como estas tocavam perto de mim. Hoje, eu prossigo não gostando, porém, quando toca este tipo de música próximo a mim, eu simplesmente não me importo. Continuo não gostando, mas tolero. Consegui, ao longo do tempo, mitigar a raiva que eu sentia das músicas, até um estado onde elas já não me abalam mais.

A minha postura intolerante na adolescência não é fato incomum. Ao contrário. Posso afirmar por experiência própria que a idade nos tranqüiliza e a falta de tranqüilidade e tolerância na adolescência nos faz verdadeiros tiranos. Por sorte, sem grandes poderes para realizar nossos intentos.

Não é a toa que tribos rivais da África utilizem crianças como pontas-de-lança na guerra. A ausência de sentimentos de culpa e responsabilidade fazem delas assassinos mortais. Na adolescência, possivelmente o período mais rico da vida de um ser, as pessoas construirão a noção plena da gravidade dos seus atos. Fato que repercutirá pelo resto de sua vida.

Da minha batalha particular (e ainda incompleta, até a morte incompleta), onde consegui robustecer a cultura da tolerância, posso garantir: só fez bem a mim e aos que me rodeiam.

Um outro fato que podemos observar com este gráfico é a zona de conforto. A zona verde é uma zona de conforto.

Toda vez que vivenciamos um fato novo, somos submetidos a pressão, somos cobrados, nós saímos da zona de conforto. E, muitas vezes, as nossas respostas que damos aos outros, também não estão na zona verde. Por exemplo, ¿qual é a resposta que àquele que deseja brigar espera do provocado? Que ele brigue, ¡é claro! Então, ¿como podemos tirar o agressor da zona de conforto, como podemos contrariá-lo? Não brigando, ¡é claro!

Como já dizia Adoniram Barbosa (1910-1982), “bom de briga é aquele que cai fora”.

Se nós brigarmos, nós estaremos sendo guiados pelo agressor, estaremos fazendo exatamente o que ele quer.

¿Que inteligência há nisto?

E assim é para toda a vida. Quando alguém nos provoca, o que quer é que fiquemos chateados. Quando não ficamos, aí sim nós estamos no controle e, o provocador está fora da sua zona de conforto.


Tolerância X Ignorância

Desta maneira, não só podemos, como devemos tentar fazer com que a nossa cultura, seja uma cultura de paz. E, chega-se à paz, com tolerância.


A lei de ouro do comportamento é a tolerância mútua, já que nunca pensaremos todos da mesma maneira, já que nunca veremos senão uma parte da verdade e sob ângulos diversos”. (Mohandas K. Gandhi - 1869-1948)

O aforismo de Gandhi, um dos poucos líderes a lutar pela independência de seu país através da paz - o que não impediu que ele morresse assassinado (“Existem várias causas pelas quais eu estou pronto para morrer, mas não há nenhuma causa para qual estou preparado para matar”, já havia profetizado o líder indiano) – representa bem o ponto onde queremos chegar.

A tolerância permite enxergar melhor, evitar erros crassos, harmonizar diferenças, permitir que haja dissensos.

Temos muitas opiniões. Porém, é de bom feitio ouvir, refletir, tentar compreender.

Muitas belas palavras já foram ditas sobre a tolerância. Já dizia Shakespeare (1564-1616) que, com a mesma severidade com que julgamos, um dia seremos condenados. Portanto, devemos tentar evitar julgar os outros, quanto mais sem ouvir a pessoa. Devemos dar as pessoas ao menos o benefício da dúvida, porque elas podem ter agido por motivos justos, desconhecidos para nós e, se nós mesmos estivéssemos passando por uma situação semelhante, poderíamos ter agido ainda pior do que julgamos que elas tenham agido.

Pois bem. Em outro texto eu havia escrito:
Os fatos são tão encadeados...
E os desdobramentos destas atitudes são eternos...

Cada atitude, cada posicionamento, cada resposta, cada procedimento, é como uma pedra jogada no meio de um lago. E, as ondas que elas formam, vão para o infinito”.

E é assim que acredito. Se nós agimos com correção, paciência, tranqüilidade, isto repercute na sociedade.
João trata bem José, que ajuda Joana, que salva Maria, que apóia Marisa, que se enternece por João.
Ou, João destrata José, que desconta em Joana, que manda Maria ir àquele lugar, que chama Marisa pra porrada, que pergunta à João o que é que ele está olhando.

Cabe a nós escolher um dos dois caminhos. Quem constrói a nossa cultura somos nós.



Alguns documentos internacionais de referência e consultados:

. A Carta da Terra;

. A UNESCO e a Cultura de Paz;
. Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou tratamentos Cruéis, desumanos ou degradantes;

. Convenção de 1951 sobre os Estatutos dos Refugiados, seu Protocolo de 1967 e seus instrumentos regionais;
. Convenção e Recomendação da UNESCO sobre a Luta Contra a Discriminação no Campo do Ensino;
. Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial;
. Convenção sobre a Prevenção e a Sanção do Crime de Genocídio;
. Convenção sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher;
. Convenção sobre os Direitos da Criança;
. Convenções de Genebra;
. Declaração da UNESCO sobre a Raça e preconceitos raciais;
. Declaração de Copenhague e o Programa de Ação aprovados pela Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social;
. Declaração de Princípios sobre a Tolerância;
. Declaração de Sevilha sobre a Violência;
. Declaração do Parlamento das Religiões sobre uma Ética Global;
. Declaração e Programa de Ação sobre uma Cultura de Paz;. Declaração e o Programa de Ação de Viena aprovado pela Conferência Mundial dos Direitos do Homem;
. Declaração sobre a Diversidade Cultural; . Declaração sobre a Eliminação de todas as Formas de Intolerância e Discriminação fundadas na religião ou na convicção;
. Declaração sobre a Paz na Mente dos Homens;
. Declaração sobre as Medidas para eliminar o Terrorismo Internacional;
. Declaração sobre os Direitos das Pessoas pertencentes a minorias nacionais ou étnicas, religiosas e lingüísticas;
. Pacto internacional dos direitos civis e políticos;
. Pacto internacional dos direitos Econômicos, Sociais e Culturais;
. Programa do Século XXI sobre a Paz e a Justiça – Programa de Haia;
. Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares.

terça-feira, 4 de março de 2008

Aforismo XXV

Sabe, eu digo mil e um aforismos no cotidiano, especialmente para as namoradas de plantão.
Depois do meu início no blog, sempre prometo que vou postá-los aqui, mas às vezes, tanto pelo conteúdo agressivo de algumas frases , quanto por esquecer o axioma, mesmo, acabo deixando de fazê-lo.
Este que citarei agora é um destes, que ficou perdido pelo tempo, dito a dona Maria:

“Quem não transou, não leu cem anos de solidão e não tomou ovomaltine, não sabe o que é a vida”.

Daí haveria outros complementos, mas desta vez eu me eximirei.