terça-feira, 8 de junho de 2010

Culturas e arquétipos

Como qualquer civilização de qualquer época, o conceito antropológico da cultura cristã ocidental nos impõe uma serie de limitações, mais ou menos explícitas conforme o caso.
E estas limitações existiriam e existem, em culturas diversas da nossa, como a nipônica, a russa, ou a muçulmana. Evidente que há muitas peculiaridades, quarks específicos dentro de universos em expansão, são muitas as especificidades que poderiam ser levantadas, incongruentes com a maioria reinante, mas há genéricas convergências que podemos elencar, mais ou menos facilmente, a depender do caso em que se avalia.
Fato é que, a despeito de serem diferentes entre si, as limitações e/ou normalidades existem dentro de cada universo cultural
Destarte, determinados padrões que julgamos ser de nosso gosto pessoal, muitas vezes nada mais são do que repetições que acabamos por assimilar com o passar do tempo.

Podemos enumerar casos famosos de elementos culturais que hoje soam como absurdos, mas eram corriqueiros outrora. Na cultura greco-romana, por exemplo, a forma como os relacionamentos amorosos aconteciam, o descarte de crianças especiais (!), o conceito matrimonial, a constância dos relacionamentos hetero e homossexuais, a maneira que lidavam com a morte, o incrível relacionamento com seus licenciosos deuses (de padrões comportamentais e instabilidade emocional dignos de uma novela mexicana), etc.
Tudo hoje nos é estranho, assim como no futuro, creio que parecerá bastante estranho o que fazemos atualmente para quem puder nos observar.
Aliás, não carece nem recorrer a algo tão serôdio para exemplificar, se avaliarmos detidamente alguns fatos que nos permeiam podemos detetar elementos curiosos que acabam nos passando despercebido justamente pela repetição cultural.
É muito estranho para um estrangeiro, por exemplo, o fato de nós, brasileiros, com raras exceções, comermos arroz e feijão todo santo dia – se é que os dias atuais são santos –, não enjoando nunca. Todo, e todo e todo dia arroz e feijão, variando os agregados tão somente.
¿Por que não enjoamos de tamanha repetição?
Porque essa é a nossa cultura, é o nosso arquétipo, entendamos como quisermos.


Pois bem, como já foi dito, dentro destes caldeirões de repetições e analogias, encontremos uma idiossincrasia que, mesmo dentro de uma cultura à qual eu deveria estar acostumado, não consigo me adaptar.
São as vestimentas do casamento como um todo.
Pensando bem, tentando avaliar com alguma isenção, assim como podemos conceber que nos alimentarmos da mesma comida todos os dias de fato é estranho, talvez consigamos imaginarmo-nos fora de nossa cultura e poderemos vislumbrar quão ridículas são as roupas que as pessoas utilizam nesta convenção social que é a cerimônia de casamento.
Vejam o vestido de uma noiva.
Pensemos bem.
¿O que é aquilo, gente, pelo amor de Deus?
¿Pra que cauda?
¿Pra que véu?
¿Por que branco?
¿Por que o símbolo da virgindade, num mundo em que sabemos que...?

¿Não é algo que vamos fazendo simplesmente porque antecedentes a nós fizeram também?
É uma tradição, compõe a nossa cultura, “pega mal” não fazer assim. ¿Mas será que é esta a maneira como devemos arquitetar nossas ações, baseando-as no passado, mesmo que equivocado e/ou nonsense?
Nem me deterei mais neste aspecto do vestido da noiva em si, para não provocar demasiado o público feminino.

¿E os homens, com seus ternos em nosso país tropical?
¿Fica bonito? Sim, fica, ¿mas faz sentido vestir-se assim, para suar a cântaros, empapando-se de suor enquanto a cerimônia ocorre na (normalmente abafada) igreja?
Aí os homens vão para a festa e lá tiram o terno, ficando trajados com uma roupa que é um meio termo sumamente interessante, pois nem estão bem arrumados mais sem o terno, tampouco estão com uma roupa confortável para a dança. Uma proeza.

Avaliemos mais detidamente as convidadas.
É evidente que uma mulher bem vestida, bem arrumada, fica mais bonita (dentro de nosso atual padrão de entendimento, é claro, sabendo que isto muda com o tempo, já que as mulheres mais gordinhas, outrora julgadas mais “fortes” para procriar, foram nosso padrão de beleza décadas atrás).
Porém, a forma como as mulheres vão para as festas de casamento – mesmo considerando o fato consabido de que as mulheres se vestem para outras mulheres – é muito estranho.
Inserem torrões de maquiagem na cara, cada penteado que mais parecem serem inspirados em algum animal selvagem africano, saltos altos elevadíssimos, que não bastassem serem esteticamente estranhos, ainda as impedem de andar (¿os calçados não deveriam ser auxílios à locomoção, e não estorvos?), e aí ficam dando aqueles ridículos passinhos curtíssimos e ainda escorando-se no parceiro para não desequilibrar. Afora os colares, tão vistosos que seriam capazes de ofuscar o mítico “coração do oceano”, aquela pedra azul utilizada pela personagem feminina de Titanic, dentre outros detalhes que me escapam agora.

Tentando avaliar com isenção, julgo que uma mulher que se arruma bem, consoante a nossa cultura, para um casamento, na verdade fica mais estranha, mais feia e mais atrapalhada que uma mulher simplesmente bem vestida que vai para um evento com seu namorado, por exemplo.

Talvez seja difícil assimilar uma ideia extemporânea destas, mas se considerarmos com a devida distância, encontraremos muitas outras estranhezas ao nosso redor.
Está certo, estamos tão acostumados que já seria até estranho imaginar as mulheres produzindo-se para o casamento de maneira diferente do atual. Mas que elas ficam estranhas, com certeza ficam...

Ah! Evidentemente, amanhã comerei o meu feijão com arroz.
Em paz.

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom!
Realmente essa questão de usar terno, ou vestido, em 40 graus na cidade não faz sentido, mas é a "tradição" que nos faz usar...
É como fazer algo e nem ao menos entendermos o motivo pelo qual se faz o fato. Simplesmente o faz pois alguém disse... etc...
Como se fazer diferente, seria ser "estranho", ou fora dos padrões...
Padrões são tão limitados.
Não os aprecio.

Beijo.
Parabéns pelo blog.

Iuri disse...

Parabéns!
Critica comum às práticas comuns também é comum!
Leia um pouco sobre conceitos de cultura. Leia um pouco sobre ideologia (não só a concepção marxista). Aprofunde-se e veja que por mais linda que pareça sua reflexão, ela está englobada em questões sociológicas bem mais avançadas. E por fim. Leia as letras emos. você se indentificará.

W disse...

existe todo um simbolismo através dessas vestes para o ritual do casamento. Não é obra do acaso.

Mas, de repente, me vi no futuro com uma certa estranheza. O que vão dizer dos trios elétricos seguidos por diversos blocos trajados de abadás?